segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Meu filho vai para a guerra

Devido à boa repercussão sobre o último post em que publiquei o excelente "Crianças Foie Gras", da Tais Vinha do blog Ombudsman, transcrevo aqui outro texto dela muito interessante também:

Meu filho vai pra guerra.


Houve um tempo em que os filhos eram tirados novinhos da proteção dos pais e criados para virar guerreiros.
Crescidos e bem treinados eram enviados para as guerras sem fim, de uma antiguidade onde tudo se resolvia a golpe de espadas.
Muitos não retornavam. Os que conseguiam, traziam nas bolsas os prêmios da vitória. E no corpo as marcas das luta: cicatrizes, mãos amputadas, pernas mancas.
Hoje em dia, para a alívio das mães, nossos filhos não são mais confiscados no berço em defesa da pátria. Mas nem por isso deixarão de guerrear. E com nosso apoio e estímulo.

Preparamos nossos filhos desde a mais tenra idade para a batalha da vida moderna. Queremos que eles sejam bilingues, que estudem nas melhores escolas, que façam esportes, informática, música, artes, kumon, simulados etc. Para quê? Para terem mais chances de vencer uma outra guerra. A guerra do mercado. Onde só sobrevivem os mais preparados. E dá-lhes preparação. Não queremos criar perdedores!
Daí, um dia, eles partem pra luta. Enfrentam competição desumana, superiores autoritários, convivem com o facão do RH dia e noite nos seus pescoços, comem mal, dormem pouco, sofrem com as explosões na bolsa de valores e com os tiroteios da vida corporativa, não tem tempo para ver os amigos.
Os anos passam e quem vence exibe o carrão lustroso, a parafernália raitéc, o quiosque do churrasco, a cozinha de aço inox, o armário repleto de roupas que não dá pra se usar numa vida. Trazem nas carteiras os cartões de crédito que financiam os prêmios da vitória. E no corpo, as marcas da luta: sobrepeso, estresse, pressão alta, diabetes, insônia, inapetência sexual, tabagismo, alcoolismo, dependência química, solidão, consumo compulsivo, filhos carentes...só para citar alguns dos males dos guerreiros e guerreiras de hoje.
Como as mães de antigamente, os receberemos sempre de braços abertos, cheias de alegria e festa. E no fundo do peito a agonia de quem sabe que o preço da luta é alto demais.
Me pergunto se as mães da antiguidade de vez em quando também questionavam: "Filho meu, essa guerra à qual você tanto se dedica, é mesmo em benefício de quem?"