domingo, 12 de setembro de 2010

Hora certa de morrer

Brincando de mamãe-filhinha na escola, Isadora descobriu que os pais podem morrer um dia. O negócio é que nenhuma das amigas quer ser a mãe (por que será?). Todas querem ser filhinhas. Querem ser cuidadas, mimadas e sem as broncas reais (porque no mundo imaginário as mães não dão bronca nunca). Até perguntei pra Isadora porque ela não queria ser mamãe. Ela respondeu que não sabe ser mãe, não sabe cuidar de filho (essa é boa). Como solução para continuar a brincadeira, alguém sugeriu que bastava fingir que a mãe morreu (pronto, mataram a mãe pra sanar o problema). Problema resolvido na brincadeira porque na vida real da Isadora surgiu um bem grande: ela soube que os pais podem morrer e de verdade.
Ela veio toda chorosa dizendo que não queria ficar sozinha sem o papai nem a mamãe. Não queria "nunquinha" que o papai e a mamãe dela morressem. E questionou porque a gente morre (ainda bem que ainda não perguntou pra onde se vai depois que morre). Expliquei que é a ordem natural da vida: as pessoas nascem, crescem e morrem (por razões óbvias pulei a parte do "se reproduzem"). Falei também que todo mundo sabe que vai morrer um dia mas não fica pensando muito nisso, não. Vamos vivendo a vida sem pensar na morte. Não acho que ela entendeu muito da conversa nem se convenceu dessa tal ordem natural das coisas. Virou pra mim com uma carinha triste e disse:
- Mãe, acho que deveria ter hora certa para os pais morrerem. (olha só como funciona a cabeça dessa menina!)
- Ah, é? (uma pergunta só indica que eu não sei mesmo o que dizer)
- Sim, e a hora certa para os pais morrerem é lá pelos 100 anos. Bem velhinhos. Quem nem o Nono! (o bisavô Ranieri, que faleceu bem velhinho há pouco mais de 2 anos. Homem notável o Nono!)

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Curioso que depois dessa conversa, Isadora nunca mais falou de morte. Acho que ela queria mesmo é saber dos mortos da família. Nesse mesmo bate-papo, falamos do meu pai e da minha avó materna que já se foram também.
Fiquei pensando porque na cabecinha da Isadora a tal hora certa para os pais morrerem estava relacionada com o Nono. Talvez as recordações que ela tenha dele envolvem os filhos reunidos nos almoços, filhos crescidos, independentes, unidos. Ah, e os netos e a única bisneta até então. Todo mundo seguindo a vida e mantendo bem fortes os laços familiares. E o Nono lá, orgulhoso e, até quando pode, sempre ativo participando de tudo. Não sei se é tudo isso que Isadora quis dizer mas é a minha visão agora da hora certa de morrer!

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